segunda-feira, 5 de março de 2018

Reticências

Existem dias na vida em que nos sentimos mal por tantos motivos que nem podemos explicar por quê estamos assim, caso alguém pergunte. E este é um desses dias.
A parte estranha deste dia é que não passei o tempo todo abatida, como muito frequentemente acontece quando estou na TPM, por exemplo. Foi um dia de altos e baixos, durante o qual eu ri, brinquei, conversei, porém no fundo sempre tinha uma sombra escurecendo um pouco todos esses momentos agradáveis.
Este dia não aconteceu de repente. Ele é só mais um dia estranho entre tantos outros que tenho vivido ultimamente. E por ultimamente, quero dizer todos os dias e anos da minha vida dos quais consigo recordar com certa clareza.
Porém está ficando pior.
Passei por um longo período de reclusão quase total, onde praticamente só saía de casa para trabalhar.
No começo foi duro. Eu estava acostumada a ter uma vida bastante agitada, trabalhava muito, mas também saía muito para me divertir em  bares, baladas, casas de amigos ou na rua mesmo. O importante era sair de casa, de resto não tinha tempo ruim.
Até que meu último relacionamento terminou e eu me vi num limbo da minha própria vida. Já nada nem ninguém me dizia respeito, nada nem ninguém tinha nada a ver comigo, eu já não sabia quem era, só sabia que não era mais aquela que eu estava acostumada a ser. Não sabia o que dizer, nem o que fazer. Decidi que precisava passar um tempo sozinha.
E o tempo passou.
Me acostumei a estar sozinha de uma tal forma que comecei a acreditar que gostava daquilo. Dizia isso para todas as pessoas do meu convívio (a saber: minha família e colegas de trabalho) e não estava mentindo. Na minha cabeça, aquilo era verdade. Me trancava no quarto com meu notebook e meu celular, desligava minha mente de tudo e ficava parada na frente das telas com a boca aberta e a cabeça vazia. Já posso ver que era uma forma de fugir da realidade e tenho que ser sincera: ainda faço isso, apenas não com tanta frequência nem por tanto tempo, mas faço.
Enfim.
O tempo passou e, em algum lugar bem lá no fundo, algo começou a se mexer. Foi mais ou menos como quando a gente dorme demais e acorda lentamente e sentindo alguma confusão (quem sou/onde estou).
Aos poucos, fui me dando conta daquilo em que a minha vida tinha se transformado.
Não era nada demais, se comparado aos problemas de outras pessoas ao redor do mundo. Mas eu vivo principalmente no meu mundo, e no meu mundo, aquela visão era assustadora, pior que qualquer pesadelo. Pior do que Aquele Dia Há Pouco Mais de Sete Anos Atrás, como eu chamo. Aliás, este foi o dia em que eu não senti nada e foi o pior dia da minha vida. Mas já passou, então vamos focar no que interessa porque é o que está acontecendo agora.
Quando olhei para aquilo em que minha vida tinha se transformado, levei um choque. Era e ainda é um pouco difícil entender como aquela vida tinha se transformado nesta vida. Foi e é difícil entender a dimensão da solidão em que me encontro, porque nunca estive tão sozinha. E, de todas as coisas, essa é a que mais me fere. Ter amigos e amores é essencial na vida de qualquer ser humano e comigo não é diferente. Porque sinto que tenho um monte de gente com quem falar, mas não há ninguém para me escutar.
Eu poderia pedir ajuda, inclusive profissional. Sei muito bem que o caos em que se encontra minha cabeça não é nada salutar. Mas também sei que será melhor pra mim mesma se conseguir resolver meus próprios problemas sozinha. Só que é tão difícil!
Porque todo o autocontrole que tenho tido ao longo da vida inteira e que é uma coisa monstruosa de tão cruel está começando a falhar. E saiba, não sou uma pessoa calma, nem paciente; apenas me inflijo doses enormes de autocontrole. Uso o autocontrole como um cilício, como um enforcador, me dilacero. Me causa muita dor. Por isso nunca perco as estribeiras. Não por tranquilidade. Não por paciência. Mas por autocontrole. E pela dor que ele causa.
Espero sincera e ansiosamente pelo dia em que vou poder olhar para trás e ver este dia como aquela pelinha solta que a gente puxa de uma vez só: dói e machuca, mas logo sara.

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