domingo, 23 de dezembro de 2018

Armadilhas da madruga

a solidão não mata mas faz sangrar
quero gritar minha dor para o mundo
às vezes parece que vou sufocar
com lágrimas que cortam fundo

eu tento de novo e de novo me iludo
meu coração esquenta, depois esfria
não economizo, sempre dou tudo
mas toda vez entro numa fria

sempre trocada, sempre deixada
sempre volto pra estaca zero
a humilhação é como uma facada
de certa forma, até já a espero

quem dera eu pudesse renascer
com outra vida, em outro lugar
onde eu não tivesse mais que ver
meu rosto no espelho a chorar...

mas já sei que querer não é poder
que não basta desejar
que nem tudo se pode ter,
que às vezes o jeito é se conformar

e assim a vida segue
e assim sigo eu
até que a escuridão de vez me pegue
e eu fique presa pra sempre no breu

Isso é um adeus

te deixo ir enfim
você também pode viver sem mim
a vida
parece uma estrada longa
e reta
sem sombra
lá em cima, o sol queimando o céu
aqui embaixo, eu
sozinha
sempre sozinha
respirando, mas sem vida
tudo é deserto
e a morte parece a única saída
e a minha alma grita
os olhos pesam
assim como os ombros
estou cansada
porque vivo sob os escombros
da esperança que um dia tive
que já não vive
eu já não vivo...

quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

Cópia autenticada

não faz assim comigo
que vc pode me matar
é que eu sou cardíaca:
meu coração acelera quando te vejo
e por isso eu posso morrer de amor
talvez, um dia!

você pediu pra eu ir com calma
porque disse que ia
botar ordem nas suas bagunças
calma, amor
eu tava só brincando
não consigo botar ordem
nem na minha vida...

nós nos espantamos
com tanta coincidência
tanta semelhança
é que eu não acredito
em almas gêmeas
mas se acreditasse
diria que você é a minha

parece meu elo perdido
minha mente em outro corpo
é até estranho
até um pouco assustador
mas fico curiosa
quero saber quem é você
e se é um outro eu
uma cópia autenticada
xerox da minha mente
e eu fotocópia da sua alma

será?
será...?
quem sabe o que será?
só o que eu sei
é o que é
e o que é
é um espanto!


segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

FlutuaMente

eu sou a dona da lua
e moro na rua que me deixa na sua
eu vivo na casa que é cheia de gente
mas eu mesma sou fora da casinha
me olha no olho e me entra na mente
agora sorri e diz que tá na minha
me chama, me fala
fala muito
fala tudo
tudo o que eu quero saber
o que eu preciso saber
é quando a gente vai se ver
(de novo)
eu entro nessa paranóia
vou me mudar pro hospício
tô manca das ideia
mas você me apóia
e fala muito
fala tudo
fala mais
que eu quero te ouvir
te ler
eu quero saber
te conhecer
ver onde isso vai dar
o piso tá molhado
nós vamo escorregar
podemos nos machucar
a menos que você me segure
e eu te segure
e a gente se segure
me escuta agora
presta atenção
no som que faz
a batida do meu coração
que diz seu nome
e o sono some
você me consome
e eu consumo o sumo
dos teus lábios
e tomo o meu rumo
vou andando
mas não me aprumo
te mando embora
mas não te deixo ir
porque no fim do dia
quero ter você aqui.

Desconexão

Meu quarto é uma zona de guerra:
o travesseiro é uma barricada que não me protege,
os lençóis revoltos são como a terra que me enterra
e a parede em frente à cama mostra que sou uma herege
que vai ser enterrada sem cruz,
que nunca, jamais vai para a luz.

Tenho azar no jogo
e minha pele pega fogo;
azar no amor,
mas o prazer se mescla à dor;
e sorte no azar,
mas sou bruxa essa noite
pra você me queimar!

As coisas que nos machucam
são aquelas que a gente permite machucar,
tipo você quando espalma a palma
bem forte que me faz gritar...

E entre tantos pensamentos
já é noite e é tarde
e Morfeu não ouve meus lamentos.
O cansaço a mim me parte
e tudo o que resta
é o amor que quero dar-te.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

VSF

Bem que eu sempre desconfiei de gente que é muito amorzinho
e muita paz no coração
Eu tava lá tranquila e olha só a situação:
Pilantra quis dar uma de técnico de futebol e me colocar no banco de reservas
Mas, mesmo que tarde, eu aprendi a lição:
só aceito entrar pro time se for como titular
E mesmo que continuem me acontecendo sempre as mesmas merdas
Eu nunca, nunca vou parar de sonhar
Um pouco doidinha? Talvez!
Mas não quero ser normal se for pra ser igual a vocês.
Em cima do palco é tudo bonito e ensaiado
Mas nos bastidores, um bando de depravados
Eu, pelo menos, sou clara: faço o que quero e sei o que espero
Quero a paixão do amor carnal
e espero a ternura do amor sincero
Moralismo já passou por aqui
Por ideias erradas que já vi e já li
Mas joguei tudo no lixo e comecei novamente
E juro que dessa vez vou aprender a ser gente!

terça-feira, 23 de outubro de 2018

O descalabro

Eu me apaixonei no momento mesmo em que o vi. Era lindo! O ambiente estava um pouco escuro, mas ele era perfeitamente visível ali. Tudo nele chamava a atenção, a começar por sua estatura exagerada.  Tinha cabelos bem curtos, cortados em estilo militar; havia uma barba rala em seu rosto que era grande e bem definido, apesar de ele estar ligeiramente acima do peso. Trazia uma fisionomia séria, quase como se estivesse zangado e seu olhar parecia ser capaz de atravessar a barreira imposta pelos meus olhos misteriosos e ir direto para dentro da minha mente. Dava um pouco de medo, mas isso servia apenas para atiçar minha curiosidade e minha imaginação... Eu era a esta altura uma mulher relativamente independente e livre, ou pelo menos assim é que eu me via. Mas isso só durava até ele chegar. Via sempre primeiro seu vulto na porta, contra o sol, aquela figura gigantesca que parecia parar sob o umbral por um momento para apreciar o efeito que causava nas pessoas, embora eu esteja quase certa de que isto seja coisa da minha imaginação fértil. A partir daí, eu já não era livre, nem independente. A partir daí, parecia que o relógio andava apenas meio segundo de cada vez. Tudo ficava em segundo plano e o que eu via, a imagem que vem à minha mente quando lembro dele naquele ambiente, era de um monte de mesas e cadeiras, as pessoas apenas sentadas, minha colega imóvel ao lado, nada se mexia, nem ninguém, apenas ele, vindo em minha direção. Dramático! Mas é isso o que lembro e certamente era isso o que sentia na época e sei que é verdade pela maneira como meu coração acelera e se confrange apenas por me lembrar... E depois de toda essa cena, quando ele finalmente chegava até mim, eu podia sentir o sangue invadir minhas faces, me causando um rubor embaraçoso e meu coração batia de uma maneira tão louca e descontrolada que às vezes me dava um pouco de tontura e parecia que ia explodir. Me sentia um pouco ridícula, meio como uma adolescente que encontra seu ídolo. A bem da verdade, não é bonito para uma mulher feita se encontrar neste estado de descalabro. Mas era assim que eu ficava. E é assim que eu fico quando, ao andar pelas ruas da cidade, vejo alguém parecido com ele. O mundo volta a parar.
Nunca troquei uma palavra com ele que saísse da formalidade; não podia. Apesar de todo este alvoroço, ele não era para mim. Mas me causou uma grande impressão!
Agora já fazem dois meses que não o vejo. E embora não o conheça e ele não seja, nem nunca tenha sido, nem nunca virá a ser nada meu, o que não daria por um relance de sua figura?! Um momento mais em que o tempo desacelerasse até quase parar e eu pudesse sentir aquele calor febril, o rubor e o caos dentro do meu peito. O que eu não daria?!

terça-feira, 16 de outubro de 2018

Fruto proibido

Homens, festas, os amigos... nada!
Não são para mim.
Não mais...
Eu mordi o fruto proibido
e meus olhos se abriram.
Olhei ao redor e o que vi me espantou
até tirar o fôlego,
porque as pessoas que me sorriam
apenas queriam mostrar suas presas,
porque os homens mais honrados que conheci
na verdade eram os maiores canalhas de todos os tempos
e porque as mulheres mais puras que já vi
poderiam competir em malícia com o Anjo Caído.
Se ao menos eu não tivesse dado aquela mordida!
Talvez isso tenha feito de mim
pior do que todos esses homens e mulheres juntos,
porque desafiei a palavra de Deus,
por isso agora eu sei
e o que se sabe não pode ser negado;
talvez para os outros sim,
mas não para si mesmo,
certamente não para mim mesma.
Por isso, fui expulsa do paraíso
para vagar sozinha por este mundo,
sempre com a visão do Éden no horizonte,
mas todos sabem que o horizonte é um lugar inalcançável;
e no deserto onde estou as miragens pipocam como milho na panela
e quando estendo a mão
achando que meu sofrimento chegou ao fim
descubro que era só mais um truque.
Delírios da solidão...
Engulo em seco.
Respiro fundo e escondo a dor e
o sorriso no meu rosto diz que está tudo bem.
Sim, está tudo muito bem!
Mas meus olhos,
ah, meus olhos!
Estes são transparentes como vidro!
O problema é que as pessoas são cegas.
Mas é só porque elas não querem ver
o que acontece quando alguém se rebela
e decide dizer a si mesmo somente a verdade
e decide abandonar as mentirinhas inocentes que contamos a nós mesmos
"Todos merecem o benefício da dúvida"
"Depois da tempestade vem a bonança"
"Mas eu não sabia... Sou uma vítima das circunstâncias!"
Todas mentiras agradáveis
que, no entanto, tornam tudo mais difícil
A verdade...
A verdade dói!
A verdade é difícil, rígida,
não permite subterfúgios,
mas a verdade não te paralisa
como fazem as mentirinhas.
As mentirinhas te transformam em serpente,
te fazem rastejar,
sibilar;
a verdade te faz ser como uma águia,
voando a uma altura de onde se pode ver tudo com clareza,
guinchando a plenos pulmões
ao avistar uma serpente mentirosa
e foi este o perigoso fruto que mordi
e que me destruiu,
mas que agora me permite ser uma pessoa melhor;
não para eles,
não para você,
não para ninguém,
ninguém!,
a não ser eu mesma;
e agora, embora esteja perdida
sei que também estou salva,
pois agora que já mordi o fruto
meus olhos estão abertos
e a serpente mentirosa
continua rastejando sobre a lama e sobre a relva
e sob minha vigília constante.
A serpente está na minha mira,
assim como você!

sábado, 6 de outubro de 2018

Natural nothing

Some people are natural artists;
some are natural mothers;
some other are natural wives,
or naturally talented at something
I'm a natural nothing,
naturally nothing,
naturally a nature's mistake...

quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Mulheres

Mulheres são seres agressivos e muito desagradáveis. Claro, temos que competir umas com as outras por um recurso bastante escasso: bons homens. Fortes, saudáveis, responsáveis. E a competição é selvagem. Porém tudo acontece sob o fino véu de mármore da civilidade. Mas, se você chegar mais perto, verá as fissuras e logo perceberá que elas foram feitas a tapas e arranhões. Verá pequenas lascas feitas por objetos atirados. E verá que a modelo sob o véu, embora tenha um rosto belo e, no geral, harmônico, tem olhos irados e assustadores e uma linha em torno da boca que indica todos os sorrisos debochados que ela já deu.
Mulheres são perigosas: têm um olfato apurado que sente de longe o cheiro da fraqueza e sua língua é afiada como nenhuma faca já feita. São também traiçoeiras: gostam de se fazer de amigas, só para se aproximar e desferir um golpe mortal, deixando a oponente lívida e exangue no chão. Sororidade?! Pff! Tente: falsidade!
Enfim, são poucas, pouquíssimas as mulheres em que se pode confiar, ainda mais em dias de sororidade extrema. Ou, como diriam Os Batutinhas: "Meninas: ugh!"

Um bom dia para morrer

Hoje é um bom dia para morrer.
O céu está azul e as nuvens,
as nuvens estão altas e brancas;
o vento sopra numa brisa perfumada
com os cheiros da primavera e
um sorriso brota nos meus lábios e,
em frente aos meus olhos,
um raio de sol atinge a parede amarela,
que fica dourada
e o mundo inteiro se enche dessa luz maravilhosa
e eu estou em paz:
tudo é tão bonito!
Nunca quero ver novamente aquele mundo preto e cinza,
de dor e feiúra.
Estou feliz e me basta a vida:
hoje é um bom dia para morrer!

domingo, 16 de setembro de 2018

Pensamentos avulsos V

(Ao som de Thegiornalisti - Questa nostra stupida canzone d'amore).
Existe um tipo de paz que só o fim de um dia produtivo de trabalho pode trazer. É aquela em que apesar do cansaço, você se sente satisfeito e orgulhoso de si mesmo porque sabe que foi útil naquele dia e, portanto, o que quer que tenha passado ao longo de tal dia, em termos de estresse, em termos de esforço, valeu a pena. É um tipo de cansaço que te faz sentir livre, feliz, iluminado...
E é assim que eu me sinto hoje, agora, neste ônibus a caminho de casa, ouvindo esta canção.

segunda-feira, 10 de setembro de 2018

Do calor

O sangue ferve nas veias e não tem vazão;
o calor fica preso e derrete a massa delicada,
do tipo folhada.
A sensualidade exala pelos poros e pelos pixels
e os olhos não se fecham porque a boca não se abre
e quando o coração acelera, a respiração encurta
e é porque pensei
mas se agir, o mundo para.

terça-feira, 4 de setembro de 2018

Sinto

Sinto uma vontade de cantar alto, bem alto, até minha voz se transformar num grito. Quero olhar diretamente para o Sol e me tornar parte de sua luz... Quero ir para um lugar novo, distante, onde ninguém me conheça e eu também não conheça ninguém. Sinto vontade de explodir em chamas laranjas que aqueçam o frio e queimar até me tornar brasas mornas e perenes. Giro em um turbilhão de pensamentos, ideias e sentimentos, cada vez mais veloz, cada vez mais velozes. Me distancio do mundo e observo tudo de fora, como se fosse a vida de outra pessoa e depois volto e sinto... Sinto tudo o que ela sentiu, tudo de uma vez. Sou o caos empurrando a ordem e a ordem lutando contra o caos. Sou as estrelas e a poeira e um grão de areia; sou uma borboleta colorida batendo levemente suas asas, vivendo sua vida de borboleta. Sou e sinto a alegria de um dia fresco de primavera e a melancolia de um dia nublado e tempestuoso. Sou e não sei como posso ser; sinto tanto que só posso viver e esperar não morrer pelo tanto que sinto

domingo, 26 de agosto de 2018

Sem chão

Aconteceu de novo. Foi a segunda vez este ano. É até engraçado e eu fico me perguntando como pode exatamente a mesma coisa acontecer com a mesma pessoa, duas vezes no mesmo ano, se a vida toda eu ouvi que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar.
O que aconteceu foi o seguinte: um homem se interessou por mim. Mas aparentemente queria só sexo. Até aí, tudo bem. Digo que tudo bem porque às vezes as pessoas só querem isso mesmo, o que é péssimo, mas é um direito delas e também porque sei que os homens são mais visuais e o fato de se interessarem sexualmente por uma mulher primeiro não significa que depois não possam vir a se interessar pela pessoa dela. Então, até aí, tudo bem. O problema é que assim que viu que não ia conseguir o que queria, simplesmente, imediatamente, entrou em um relacionamento com outra mulher. Eu não tive nem chance de me dar a conhecer. E foram duas vezes. Eles já tinham outras mulheres em suas vidas a quem conheciam e amavam (ou nem tanto) e só queriam mesmo satisfazer seu desejo de estar com uma mulher que é magra, pequena, mas tem uma bunda grande, porque foi isso o que aconteceu. Tenho mesmo uma bunda desproporcional ao meu corpo e foi só isso o que eles viram. Ridículo, eu sei. Mas doloroso.
Da primeira vez, parecia que eu estava sendo esmagada, apertada de todos os lados, a dor que senti foi excruciante, perdi até o fôlego. Foi horrível; da segunda vez, já estava um pouco ressabiada, meio desconfiada, mas ainda assim curiosa. E esta foi rápida. Da primeira vez, o homem em questão ficou cerca de três meses no meu pé, insistindo, mas toda vez que me chamava para sair, era da minha casa para a dele. Desta segunda vez, ele não me chamou para ir à casa dele, ou a qualquer lugar, mas em questão de uma semana desistiu e pediu a outra em namoro. Ah! E um detalhe: o primeiro pediu a outra em casamento. Por isso também foi pior da primeira vez, porque ele já tinha um relacionamento bastante sério.
Esta segunda vez, não doeu tanto, mas eu senti que o chão tinha sumido de debaixo dos meus pés. Sei que esta é uma expressão bastante batida e eu mesma sempre a achei muito dramática, mas foi exatamente o que eu senti: que o chão tinha sumido e eu estava caindo, caindo... E não tinha ninguém para me pegar e não tinha solo para parar minha queda e eu ia ficar só caindo para sempre, com aquele vento passando pelos meus ouvidos e aquela velocidade e eu novamente sem fôlego. Eu estava no ônibus e pensei: "Não vou chorar!", enquanto as lágrima já estavam se formando, mas eu respirei fundo, olhei para cima e fiz elas voltarem para trás, mas assim que baixei a cabeça novamente, elas retornaram e eu fiquei tentando não chorar, pensando que eu já tinha passado por aquilo e que eu já estava mesmo desconfiada e que eu deveria ser mais forte do que isso, porque chorar não ia resolver nada... Mas assim que cheguei em casa, apenas tive tempo para abrir meu quarto e tirar a bolsa do ombro. E chorei. Chorei e ri ao mesmo tempo, porque era tudo muito ridículo e as lágrimas iam caindo, eu pensava que meu rímel estava escorrendo e eu devia estar com uma cara horrível e eu ria e ria e chorava... E senti tudo: tristeza, raiva, um pouco de alívio por saber que, por mais horrível que fosse, eu não tinha mais motivo para desconfiar porque agora tinha certeza. E ri e chorei. No fim, meus olhos estavam pretos, minha cara desfigurada de inchaço, minha vontade (de viver ou de qualquer coisa), desaparecida. Liguei o notebook e fiquei horas na frente dele, vendo um vídeo atrás do outro no YouTube, me esforçando para não pensar. Cheguei em casa às dez da noite e só fui conseguir dormir mais de três horas da manhã.
Quando acordei, já era quase meio dia, eu me lembrei imediatamente do que tinha acontecido e quis chorar novamente. Mas também quis fazer outras coisas. Fiquei agradavelmente surpresa ao perceber que minha vontade tinha voltado e minha esperança não tinha morrido e eu já estava pensando em maneiras de sair dessa minha solidão terrível. Quero calçar um tênis e por uma roupa confortável e ir andar até minhas pernas tremerem; depois vou sentar e tomar uma água de côco e talvez depois ande mais um pouco. E minha esperança é que alguém, conhecido ou desconhecido, me veja e me chame para conversar, que eu possa hoje começar uma nova amizade, ou um novo relacionamento, pois eu não desisto, não deixo de ter esperança, sou assim. Não quero sofrer e com certeza não quero mais chorar. Quero ficar bem. Quero lutar por mim e vencer. E vou. Vou porque quero e, quando quero, ninguém me segura! Por isso, vou. Fui!

sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Aqui dentro

Solidão é ter tanta gente ao seu redor, mas ninguém perto de você.
A vida é como um belo jardim ao alcance da sua visão, porém a um abismo de distância, e não há ponte...
Felicidade é um arco-íris e suas cores são vibrantes, mas você é daltônico.
Os dias foram curtos e a noite já dura demais. E é dura demais. E escura demais.
E a estrada é íngreme e tão longa que parece nunca acabar...

sábado, 16 de junho de 2018

O que é o amor

Estes arroubos de paixão
Que me inquietam a alma
Que me fazem vibrar e,
principalmente,
sofrer.
Estes arroubos sôfregos
são como uma febre,
mas uma febre incurável, letal;
uma febre que mata
pois faz sangrar o coração:
hemorragia inestancável.
E não há alegria na paixão,
apenas angústia e urgência
e uma certa violência.
A paixão não é como o amor.
O amor é sereno:
cuida sem sufocar
e protege sem adular;
não é vermelho,
pois não é quente,
nem nos queima:
o amor é morno
e nos aquece.
O amor é verde,
pois não sobrecarrega
o coração:
antes, refresca a alma,
é leve e nos acalenta a vida.
E, enquanto para a paixão
não há torniquete ou remédio
que funcione,
para o amor nada disso é necessário:
o amor é uma droga que vicia sem enfraquecer,
fortifica os laços e alimenta a esperança.
O amor é tudo o que a paixão não é
e jamais poderá ser:
o amor sou eu,
sorrindo pra você.
Vida.

terça-feira, 15 de maio de 2018

O que vejo atrás de meus olhos I

Ele me olha, chega mais perto e sorri. Com uma mão, levanta meu queixo e com a outra, envolve minha cintura. Um passo dele para a frente me faz involuntariamente dar um para trás, de forma que dois ou três passos depois, estou com as costas na parede; já não havia mais escapatória. Não que eu quisesse escapar, apenas o pudor me fez andar para longe dele, embora ficasse feliz em saber que ele não se afastaria. Ao chegarmos então à parede, ele deu um último passo em minha direção, o que fez com que nossos corpos ficassem completamente colados um ao outro. Deu então meio passo para trás, apenas o suficiente para que conseguisse aproximar de mim, que era cerca de quinze centímetros mais baixa, o seu belo rosto. Olhou- me nos olhos e então baixou o olhar para a minha boca. Respirou fundo, apertou- me mais em seus braços e me beijou com uma paixão que eu jamais havia sentido antes em homem algum, e jamais tornaria a sentir. Ele agora era meu e eu, dele. E, juntos, éramos um só.

sexta-feira, 20 de abril de 2018

Pensamentos Avulsos IV

Não quero nem pensar em nada. Nem quero ver nada, nem ouvir nada. Porque pensar, ver e ouvir são coisas que fazem a gente sentir e nem sempre o que se sente é bom. O que sinto agora, por exemplo, é quase tão ruim quanto não sentir nada. É solidão, é ciúme, é ansiedade, é frustração, é tudo junto. É o medo do tempo; o tempo já bem próximo e o tempo ainda vindouro. O que sinto agora é também o peso do tempo que já vivi; o que sinto agora é desejo, porém um desejo tresloucado de algo que nunca acontecerá. O que sinto agora é raiva e também impotência. Sinto tanto, mas tanto, que fiquei paralisada. Os olhos de olhar ausente eram a única coisa que se movia em mim. Porém o que eles viam era apenas uma ilusão, provocada por uma esperança vã.
O que os meus olhos viam era a imagem de uma vida que nunca terei: uma vida de paz de espírito, de amor romântico, ainda que real, de alegria de viver, de força e resistência. O que os meus olhos viam em minha ausência, era algo que nunca verão em minha presença, pois minha presença por si só é o que torna vã minha esperança.
Por isso, procuro me resignar à vida que me espera. Respiro fundo e mantenho a aparência de calma, mesmo que por dentro esteja queimando em um incêndio terrível de proporções apocalípticas. Exagero, eu sei. Mas é como me sinto: sou feita de fogo e queimo até a última camada de mim mesma. E queimarei também todos que se aproximarem demais. Melhor então queimar sozinha!

sábado, 14 de abril de 2018

Olhos de jabuticaba

Ele tem um par de olhos grandes e escuros, como duas jabuticabas. Sempre noto isso primeiro. E então vejo aquele sorriso sempre prestes a acontecer, quase ali...
Seu rosto é a última imagem que vejo atrás de minhas pálpebras fechadas antes de dormir e seu nome, o último pensamento lúcido que tenho.
Ao acordar, novamente me vêm a cabeça seu rosto e seu nome, com tanta força que quase posso sentir o calor de seu corpo e o som de sua respiração ao meu lado na cama; e minha mente ainda confusa ao despertar se espanta um pouco de que ele não esteja realmente aqui. Ele reina absoluto em meus pensamentos; a lembrança de sua pessoa me acompanha ao longo dos dias e das noites. Às vezes penso que estou perturbada, perdida... E de fato estou. Mas não me incomodo por isso. Sempre que o vejo, penso, ou lembro dele, é com muita ternura e alegria. E assim vou levando os dias até que os dias o levem de minha mente ou o consolidem aqui por muito, muito tempo.

sábado, 7 de abril de 2018

Intento de rendição

Quero alguém
Quero alguém pra ser meu companheiro de vida
pra eu não precisar andar sozinha por esta estrada
tão longa, tão bela,
porém tão cheia de obstáculos;
tão difícil...
Pra ter com quem dividir minhas alegrias
pra ter com quem dividir minhas lágrimas.
Pra ter um amigo,
um parceiro,
um amante.
Pra dar o melhor de mim
e sorrir os meus sorrisos mais bonitos
e mais felizes.
Pra brigar e pra brincar
pra dormir e acordar
pra viver reclamando
e morrer de amor.
Pra ser eu e estar nele
e ele ser uma nova pessoa em mim...
Pra ver a luz de seus olhos
e estar na sombra de seu olhar.
Quero alguém pra me encantar
e a quem eu possa fascinar.
Quero alguém assim
e por ele vou esperar.

segunda-feira, 26 de março de 2018

Sobre objetividade

Esses dias ouvi de uma pessoa do meu convívio que me falta objetividade. Isto não me foi dito como uma grosseria, mas sim como uma dica e estava relacionada a uma situação bem específica. E, assim que foi dito, senti como se tivessem acendido um interruptor na minha mente. Porque era isso o que estava faltando. Era nisto que eu estava errando. Porque a minha vida sempre  parecia voltar para o mesmo ponto, que era o ponto morto. E eu estava andando em círculos.
Mas a partir do momento em que ouvi aquela palavra, dita daquela forma, eu entendi tudo. E agora já posso parar de andar em círculos, e entrar em um caminho linear, cuja única direção possível é para a frente.

domingo, 18 de março de 2018

Pensamentos avulsos III

...às vezes parece que ainda não comecei a viver minha vida. como se estivesse esperando por alguma coisa, como se esperasse algo acontecer para então dar início a... o que? não saberia dizer exatamente como ou o que é uma vida que já começou. só sei que a minha já está correndo, mas ao mesmo tempo é como se estivesse parada. vejo todos passando por mim, vejo o tempo passar, vejo um desfile de coisas, de assuntos, de tendências do momento, que mudam a todo momento, claro. mas quando se trata de minha própria vida, vejo apenas um caminho pavimentado e tudo em torno é muito escuro, apenas este caminho de cimento, duro, áspero, longo, quase como se fosse interminável e que é perfeitamente visível. de resto, tudo um breu. isso me assusta um pouco. e se...? e se no fim eu estiver só, se não houver ao meu redor ninguém que eu conheça, ninguém que eu ame ou amei e que me ame de volta? porque no fim das contas tudo se resume a isso: aqueles que te amam. não, não é bem isso. ou é? bem, tenho a sensação de que o mundo é muito grande e eu, muito pequena. tenho a sensação de que se morrer sem ninguém, terei fracassado na vida e este será o pior dos fracassos. afinal, se você falha em algo, pelo menos você tentou e sempre vai ter alguém pra te dizer isso com toda a sinceridade e pra te apoiar e te consolar. mas se você não tem ninguém... se você não tem ninguém, a vida é como um abismo e você só vai caindo, caindo... e quando chegar lá embaixo não morrerá, mas encontrará uma solidão terrível e será tudo muito escuro e muito assustador e você será pequeno, pequeno... e as únicas coisas que haverá ao seu redor serão seus medos e não haverá ninguém para te proteger deles, para dizer que foi tudo um pesadelo e vai ficar tudo bem, é só um sonho ruim, volte a dormir e sonhe com os anjos... não, definitivamente não haverá ninguém e nada além dos seus medos. e você estará sozinho com eles, lutará sozinho contra eles e, mesmo que vença, sua vitória terá um gosto amargo, terrível, porque você não terá com quem compartilhar. por isso, trate de não estar sozinho e trate de  não passar muito tempo dentro desta cabecinha porque sempre tem uma Paloma à espera do menor erro, da menor brecha, para escapar de sua cela e te dar o dia perfeito.

sexta-feira, 16 de março de 2018

Amar a quem

Ser um ser apaixonado
E não ter a quem oferecer
E ver o riso virar lágrimas
Lágrimas que às vezes doem
E às vezes aliviam

Amar e não ter a quem
E querer rasgar o peito
E gritar
E cantar

Sofrer sem querer
Estar aberto
Ante uma porta fechada
E cegar
E calar
Por não ter a quem ver
E falar:
Eu te amo!

quinta-feira, 15 de março de 2018

No calor do momento

Não sei se é o calor que me derrete
Ou se eu é que me derreto por você
Mas tudo se mistura
O doce com salgado
Áspero e suave
E nos meus lábios
O gosto que devem ter os seus
E a malícia inocente
Que devem ter seus beijos
Imagino eu...

segunda-feira, 12 de março de 2018

O Monstro

O monstro estava parado com o olhar fixo. Ele tinha os olhos vermelhos de raiva e de dor. Era um monstro muito perigoso. Seus olhos eram fundos e traziam enormes olheiras roxas, escuras, profundas. Os ossos malares eram pronunciados e as faces, chupadas. Sua pele, contudo, era surpreendentemente bronzeada e de aspecto vivo e saudável. E, de fato, aquele monstro estava vivo e prestes a despertar.
Sua figura estava quase completamente imóvel, exceto pelo subir e descer de seu peito magro e ossudo, adornado por pequenos seios redondos, enquanto respirava. A cada vez que inalava o ar, seus olhos e olheiras pareciam escurecer mais um pouco e sua fisionomia adquiria um quê cada vez mais acentuado de crueldade. O monstro era feito de maldade pura. Ele era feito de tudo de ruim que havia.
O monstro sentia ódio. Era disso que ele se alimentava, também. E a dor de mil feridas abertas e sangrando não o permitia pensar em outra coisa. O monstro estava acorrentado e isso só provocava mais ódio. Mas enquanto acordava, ele puxava suas correntes e, assim, elas estavam quase arrebentando. Faltava pouco, agora... E seu carcereiro seria um brinquedo em suas garras afiadas e alimento em suas presas famintas. Ele iria sair dali e todos que se pusessem em seu caminho seriam esmagados sob seus pés, com toda a força de sua fúria. Ele era um monstro.
Mas então uma luz se acendeu, atrapalhando sua visão mais acostumada ao escuro e a porta da cela se abriu. Um anjo entrou.
O anjo trazia correntes em suas mãos, correntes novas, brilhantes, fortes. O monstro começou a se debater, pois percebeu que seria mantido preso, e suas correntes antigas se soltaram das paredes e ele avançou sobre o anjo de luz. Mas o anjo espalhou aquela claridade brilhante em frente ao monstro como se fosse uma barreira, uma que ele não conseguiria ultrapassar. O monstro bateu na barreira e foi jogado para o fundo de sua cela, onde o anjo o aprisionou em suas novas correntes e o subjugou e, com um toque em sua testa, o fez cair desacordado.
Neste momento, Paloma deu por si parada em frente ao espelho, com um olhar que nunca havia visto antes em seu próprio rosto e a boca retorcida em um sorriso maldoso e sarcástico. Ela estremeceu, secou as lágrimas que escorreram sem que houvesse percebido e saiu dali. "Estou muito cansada, pensou, melhor começar a dormir mais cedo."
Assim, Paloma partiu para iniciar mais um dia de trabalho, sem perceber o monstro de olhar louco e sorriso maldoso e sarcástico que ficara a observá-la do espelho...

Momento crepuscular

Andando à noite, sozinha
Sentindo a tristeza envolver minha alma
como se fossem os tentáculos de um polvo

Gostaria de explodir
em um milhão de pedacinhos de raiva pura
E que os meus estilhaços batessem nas paredes
com toda a força do ódio

Que as paredes e os muros e as coisas e as pessoas
E todo o mundo inteiro
Que tudo desabe apenas com a força
e o peso dos meus passos


Que nada sobre para contar a história
Nem eu.

sábado, 10 de março de 2018

O nome da felicidade

Guardo na mente a sua face
Que bem unânimes meus olhos vêem bela
E me dá um tão grande prazer
Sonhar, ver, sorrir, voar e amar.

Beleza não põe a mesa
Mas a minha já está posta
Com café da manhã, almoço e janta.

O nome da felicidade é o seu.

A moça apaixonada

Denise estava quase pedindo a Deus, embora fosse atéia. Não se lembrava qual era a última vez em sua vida que havia desejado algo com tanta força, nem com tanta vontade. Ela havia se apaixonado.
Não era ainda amor o que Denise sentia, nem poderia ser, já que não sabia nada a respeito daquele homem, a não ser uma ou duas coisas de menor relevância.
Entretanto, desde sua adolescência que ela não sentia algo tão puro e nunca havia sentido nada tão leve, pois até mesmo seus amores de adolescente vinham acompanhados do peso da angústia de não saber se seria correspondida. Não que ela soubesse agora. Mas não saber se era desejada de volta não a fazia sofrer como em todas as outras vezes.
Ela o havia conhecido por acaso e jamais esperaria interessar-se por ele. Estava um pouco surpresa, na verdade, que houvesse acontecido. Estava surpresa por tudo, na realidade.
Ao pensar nele ou simplesmente ter um vislumbre da imagem dele em sua mente, a moça sentia seu coração disparar e bater de um jeito que se assemelhava ao bater das asas de um beija-flor, o que causava uma pressão em seu peito e a fazia sentir como se o coração fosse subir por sua garganta e pular pra fora da boca e começar a voar como uma borboleta que fosse apenas carregada pelo vento.
Frequentemente, Denise se pegava olhando para o nada, com um sorrisinho bobo e tinha vontade de chorar e rir ao mesmo tempo. Às vezes, tinha vontade de gargalhar. Estava simplesmente tão feliz!
Ela não conseguia tirá-lo da cabeça. Em um momento qualquer, a todo momento, seu rosto vinha à mente. Denise se lembrava de seus olhos grandes, que carregavam um olhar que transmitia ao mesmo tempo firmeza e suavidade; um olhar que deixava claro que aquele era um homem seguro de si em confiante em si; lembrava-se de sua boca tão bem desenhada, cujos lábios pareciam estar sempre prestes a se abrir num sorriso que sempre a fazia esquecer até mesmo seu próprio nome, por um momento; lenbrava-se de sua risada, que tinha um som mais lindo do que a música mais linda que ela já ouvira; lembrava-se de seu corpo esguio e ágil... Ele nunca estava muito longe do centro de sua mente. Às vezes, parecia que se esticasse a mão, ele se materializaria bem ao seu alcance.
Denise nunca se sentira tão bem antes, ao se apaixonar. Nem acreditava que estava feliz assim. Nem entendia por que estava feliz assim. Só entendia que o queria pra si, mais que tudo, mais que todos. Precisava dele. Mas se não o tivesse, ainda assim poderia explodir de felicidade.
Denise se levantou e sorriu. Respirou fundo e viu a imagem dele mais uma vez em sua mente. Foi embora terminar seu turno e pensou que fosse como fosse, era assim que deveria sentir-se sempre: feliz.

segunda-feira, 5 de março de 2018

Sobre o medo

Uma das piores coisas que uma pessoa pode fazer consigo mesma é viver com medo. E eu tenho vivido com medo por muito tempo. De fato, tenho vivido assim a vida toda e esse medo tem sido meu monstro embaixo da cama.
Eu sinto medo das pessoas. Tenho medo do julgamento que vão fazer de mim. Sei que as pessoas julgam e aquelas que dizem que não, são as que mais julgam.
Tenho medo da reação que as pessoas possam ter quando eu não for, não fizer ou não disser o que elas esperam.
Tenho medo do que as pessoas vão sentir em relação a mim e do que vão pensar de mim se eu deixar a desejar.
Tenho medo de dar o passo errado e acabar caindo em algum buraco. Tenho medo de dar o passo certo, mas descobrir que não era o certo para mim.
Tenho medo de me casar e de ter filhos. Tenho medo de me apaixonar novamente e tenho medo de ser correspondida.
Tenho medo de ser eu mesma.
Eu tenho tanto medo que sinto vontade de gritar. Tanto medo, que às vezes sinto dores físicas pela tensão mental que se reflete no meu corpo em forma de tensão muscular.
Eu tenho medo de explodir de tanto medo.
Mas não é justo. Eu não estou sendo justa comigo mesma, sei disso.
Mas agora chega. É hora de dar um basta nisso. Decidi que, de hoje em diante, vou combater essa condição que tanto mal tem me feito. Vou respirar fundo, estufar o peito e me encher de coragem, ou pelo menos me esvaziar do medo máximo possível.

Reticências

Existem dias na vida em que nos sentimos mal por tantos motivos que nem podemos explicar por quê estamos assim, caso alguém pergunte. E este é um desses dias.
A parte estranha deste dia é que não passei o tempo todo abatida, como muito frequentemente acontece quando estou na TPM, por exemplo. Foi um dia de altos e baixos, durante o qual eu ri, brinquei, conversei, porém no fundo sempre tinha uma sombra escurecendo um pouco todos esses momentos agradáveis.
Este dia não aconteceu de repente. Ele é só mais um dia estranho entre tantos outros que tenho vivido ultimamente. E por ultimamente, quero dizer todos os dias e anos da minha vida dos quais consigo recordar com certa clareza.
Porém está ficando pior.
Passei por um longo período de reclusão quase total, onde praticamente só saía de casa para trabalhar.
No começo foi duro. Eu estava acostumada a ter uma vida bastante agitada, trabalhava muito, mas também saía muito para me divertir em  bares, baladas, casas de amigos ou na rua mesmo. O importante era sair de casa, de resto não tinha tempo ruim.
Até que meu último relacionamento terminou e eu me vi num limbo da minha própria vida. Já nada nem ninguém me dizia respeito, nada nem ninguém tinha nada a ver comigo, eu já não sabia quem era, só sabia que não era mais aquela que eu estava acostumada a ser. Não sabia o que dizer, nem o que fazer. Decidi que precisava passar um tempo sozinha.
E o tempo passou.
Me acostumei a estar sozinha de uma tal forma que comecei a acreditar que gostava daquilo. Dizia isso para todas as pessoas do meu convívio (a saber: minha família e colegas de trabalho) e não estava mentindo. Na minha cabeça, aquilo era verdade. Me trancava no quarto com meu notebook e meu celular, desligava minha mente de tudo e ficava parada na frente das telas com a boca aberta e a cabeça vazia. Já posso ver que era uma forma de fugir da realidade e tenho que ser sincera: ainda faço isso, apenas não com tanta frequência nem por tanto tempo, mas faço.
Enfim.
O tempo passou e, em algum lugar bem lá no fundo, algo começou a se mexer. Foi mais ou menos como quando a gente dorme demais e acorda lentamente e sentindo alguma confusão (quem sou/onde estou).
Aos poucos, fui me dando conta daquilo em que a minha vida tinha se transformado.
Não era nada demais, se comparado aos problemas de outras pessoas ao redor do mundo. Mas eu vivo principalmente no meu mundo, e no meu mundo, aquela visão era assustadora, pior que qualquer pesadelo. Pior do que Aquele Dia Há Pouco Mais de Sete Anos Atrás, como eu chamo. Aliás, este foi o dia em que eu não senti nada e foi o pior dia da minha vida. Mas já passou, então vamos focar no que interessa porque é o que está acontecendo agora.
Quando olhei para aquilo em que minha vida tinha se transformado, levei um choque. Era e ainda é um pouco difícil entender como aquela vida tinha se transformado nesta vida. Foi e é difícil entender a dimensão da solidão em que me encontro, porque nunca estive tão sozinha. E, de todas as coisas, essa é a que mais me fere. Ter amigos e amores é essencial na vida de qualquer ser humano e comigo não é diferente. Porque sinto que tenho um monte de gente com quem falar, mas não há ninguém para me escutar.
Eu poderia pedir ajuda, inclusive profissional. Sei muito bem que o caos em que se encontra minha cabeça não é nada salutar. Mas também sei que será melhor pra mim mesma se conseguir resolver meus próprios problemas sozinha. Só que é tão difícil!
Porque todo o autocontrole que tenho tido ao longo da vida inteira e que é uma coisa monstruosa de tão cruel está começando a falhar. E saiba, não sou uma pessoa calma, nem paciente; apenas me inflijo doses enormes de autocontrole. Uso o autocontrole como um cilício, como um enforcador, me dilacero. Me causa muita dor. Por isso nunca perco as estribeiras. Não por tranquilidade. Não por paciência. Mas por autocontrole. E pela dor que ele causa.
Espero sincera e ansiosamente pelo dia em que vou poder olhar para trás e ver este dia como aquela pelinha solta que a gente puxa de uma vez só: dói e machuca, mas logo sara.

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

O Inverno da Vida

Às vezes parece que a nossa vida é feita de estações. E quando estamos vivendo no verão da vida, é terrível ver o outono chegar porque, invariavelmente, o outono é sucedido pelo inverno. E o maior problema com isso é que as estações da vida não têm prazo de validade.
Ao longo do último ano todo tenho vivido principalmente no verão. Claro que, como é natural no verão, há alguns dias de chuva, mas mesmo nestes ainda podemos sentir calor.
Porém ultimamente tenho sentido o vento esfriar e o som das chuvas que têm caído já perderam aquela qualidade calmante e os dias são um pouco mais escuros e mais curtos. Já aquela sensação de urgência que nos põe em alerta contra o frio começa a se enraizar na terra fértil da minha mente imaginativa até demais.
Já os meus pensamentos se tornam um pouco mais obscuros e pesados e aquela sensação de estar sozinha e isolada em meio ao monte de gente que sempre me cerca luta para chegar à superfície do mar dos meus sentimentos e gelar as águas da praia onde tenho estado de férias durante todo esse longo verão.
 Posso sentir a melancolia que precede o frio, enquanto vejo o sol se por um pouco antes da hora. Mas então ele ilumina o céu de uma maneira muito específica que só pode acontecer no verão e isso me faz lembrar de uma coisa muito importante.
O brilho alaranjado do sol poente de verão faz com que eu me dê conta de que, ao contrário do que acontece no mundo exterior, eu posso controlar as estações do meu mundo particular e isso me faz abrir um sorriso e trás uma lágrima de esperança e faz com que aquele mini-eu que está na praia se espreguice languidamente, deitando-se sobre a areia dessa praia que é só dela.
E então eu e ela fazemos um trato: não vamos permitir que o inverno volte. Pelo menos, não agora. Não por enquanto.
Agora é verão e vai continuar sendo até que a vinda do inverno seja inexorável. E este momento não é agora.

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Lorena: entre dois amores

Lorena estava entre dois amores.
Um deles era doce, carinhoso, divertido, leve; o outro era mais selvagem, livre, determinado, carnal. Ela queria sinceramente aos dois e sabia que ambos a queriam. Porém, sabia também que somente poderia ficar com um e isso realmente partia seu coração. Lorena não se conformava com o ter que escolher.
De manhã ela saía de casa na expectativa de ver o primeiro deles e ia animada ao seu encontro, já sabendo que daria muitas risadas e se divertiria imenso, que seria mimada e paparicada como poucas.
Aos finais de semana, por conta de seus compromissos nesses dias, podia ver aquela fera apaixonada que mexia com ela e a tirava do eixo. Com ele, poderia dar por certo que seria desejada, farejada, caçada mesmo. Ele era como um leão e ela, sua presa.
Esses eram os dois homens de sua vida e ela amava um e estava apaixonada por outro e já vinha lidando com este impasse por alguns meses. Não havia tocado nem se permitido tocar por qualquer um e a expectativa a estava matando. Mesmo assim, ela tinha que confessar a si mesma que era divertido estar naquele lugar, naquela posição onde cada passo tinha que ser dado com o máximo de cuidado, pois era como um castelo de cartas e a mais leve brisa poria tudo o que ainda nem existia abaixo.
Lorena pedia conselhos às amigas e elas sempre diziam para que ela escolhesse, pois não seria direito ficar com os dois e ela acabaria sem nenhum. Mas ela simplesmente não podia. Não havia a menor possibilidade de abrir mão deste amor ou daquela paixão.
Havia ainda uma terceira opção, que era permanecer sozinha e, na realidade, Lorena achava que no seu caso seria o melhor. E, de fato, se nenhum dos dois estivesse interessado nela, esta seria sua escolha. Mas não era assim. Ela era amada com ternura e desejada com violência. Ela tinha tudo o que queria e, se fossem um, seria o melhor de dois mundos, mas eram dois. Eles eram dois e ela queria ser dos dois, sem poder ser de nenhum.
Lorena estava entre dois amores.
Ela estava entre dois amores e se via em uma encruzilhada, imóvel, sem saber pra onde ir.
E então, depois de muito pensar, analisar, raciocinar, sentir, Lorena decidiu: não ia escolher. Não podia. Ela seria dos dois e os dois seriam dela. Viveria seu amor de segunda a sexta e, aos sábados e domingos seria amada. E assim foi.
De manhã ela saía de casa na expectativa de ver o primeiro deles e ia animada ao seu encontro, já sabendo que daria muitas risadas e se divertiria imenso, que seria mimada e paparicada como poucas. E era. Sentia um carinho quase doloroso por ele e o beijava e abraçava, sorria e brincava e o fazia o homem mais feliz de todos. Ela o amava e dizia sempre isso e era sincera. E era feliz.
Aos finais de semana, por conta de seus compromissos nesses dias, podia ver aquela fera apaixonada que mexia com ela e a tirava do eixo. Com ele, poderia dar por certo que seria desejada, farejada, caçada mesmo. Ele era como um leão e ela, sua presa. Ele a tinha por entre suas garras e suas presas e a fazia em pedaços. Ele a atacava com fúria, seus abraços eram como barras de ferro, quando a beijava, comia sua boca.
E ela era feliz. Andava sobre pregos, mas era feliz e não trocaria sua vida por nada no mundo.
Lorena agora vivia dois amores.

sábado, 27 de janeiro de 2018

Desirée

Desirée o havia conhecido havia pouco mais de duas semanas. Pouco sabia sobre ele, exceto seu nome e que era muito atraente. Muito atraente.
Ela o havia desejado desde o primeiro instante e gastou algum tempo tentando descobrir se ele tinha namorada e se poderia conquistá-lo. À primeira pergunta, conseguiu resposta perguntando a alguns conhecidos em comum e à segunda, conseguiu resposta por acaso, ao flagrá-lo a olhando de um jeito que ela conhecia bem. A partir daí, sabia que seria apenas uma questão de tempo. E nem foi muito tempo.
Duas semanas após se conhecerem, foram convidados para a mesma festa, coincidência pela qual ela obviamente era bastante culpada.
A tal festa não estava lá essas coisas, mas não importava. Aliás, era melhor ainda: mais fácil conseguir tirá-lo de lá. Devagar, cautelosamente, como quem não quer nada, foi se aproximando.
Então, começaram a conversar e ela seguiu todo o protocolo: sorriu, mexeu no cabelo, tocou levemente em seu braço. Lá pelas tantas, decidiu que já estava bom de enrolação.
Desirée já havia deixado escapar que tinha vindo sozinha e estava a pé. E que morava sozinha. Portanto, quando disse que queria ir embora, ele se ofereceu para acompanhá-la até sua casa. Foram a pé e, mesmo sendo noite, ainda fazia um forte calor, de forma que ao chegarem, ela logo lhe ofereceu um copo de água, o que era um sinal claro como o dia e que ele entendeu muito bem. Aceitou.
A moça o introduziu à sua casa, deu-lhe o copo de água e ausentou-se com a desculpa de ir ao banheiro. Quando voltou, estava vestindo um short jeans e uma blusinha colada. Abriu a janela ruidosamente, reclamando do calor e abanou-se um pouco com as mãos, inclinando-se levemente sobre o batente. Chamou- o para que também tomasse um pouco de ar, porém ela ocupava todo o espaço em frente à janela, de modo que o único lugar que sobrava a ele era atrás dela, bem onde ela o queria. Desirée virou-se devagar até que ficassem frente a frente, os corpos quase colados de tão próximos. Respirou fundo para que se peito subisse e, ao exalar, inclinou-se levemente para a frente, soltando o ar na altura de sua orelha. Foi o suficiente: qualquer coisa que ainda o estivesse segurando foi soprada para longe.
Desirée prendeu a respiração quando  ele a agarrou pelos quadris e a empurrou com força contra a parede. Ali ele a atacou sem piedade, como um leão atacaria sua presa, mas ela, como boa caçadora que era, sorriu todo o tempo e aproveitou o resultado de sua caçada muito bem sucedida.